Tudo que você precisa hoje em dia para produzir um vídeo de skate cabe na palma da mão. Já acostumados com essa facilidade tecnológica muitas vezes esquecemos de como já foi difícil e trabalhoso conseguir fazer um vídeo de skate.
Por esse motivo fomos conversar com um dos percursores do skate e o 1º videomaker de skate do Brasil, o mestre Cesinha Chaves.
Cesinha foi pioneiro em introduzir o carrinho na mídia impressa e televisiva, e nesta entrevista especial ele conta como tudo aconteceu, e como foi a transição da era analógica até a digital.
Comparo muito ao andar de skate, onde você aprende a andar, andando. Fui aprendendo a gravar e editar, fazendo.
Antes de ser homem de TV sempre fui skatista. Passei a ser um skatista com uma câmera na mão, documentando as minhas andanças pelo mundo do skate
Aos 62 anos, 48 de skate e 39 de mídia especializada Cesinha nos revela um pouco de sua história, como o 1º skate, viver o sonho americano, sua primeira matéria de skate publicada em uma revista, amizade com lendas mundiais, os primeiros equipamentos de filmagens e as dificuldades até colocar um programa de skate no ar e muito mais. Imperdível!
Como foi essa sua transição do surf para o skate?
Meu 1º skate é de 1969, um surfinho, feito de patins estrela pregado numa tábua. Em 1974/75 comecei a dedicar um pouco mais de tempo ao skate do que ao surf, com a chegada das rodas de uretano com rolamentos e eixos próprios, o skate me seduzia cada vez mais.
Enquanto que no surf você tem de esperar por condições próprias para poder curtir bem, no skate não havia essa. Quando descobri a pista de skate de Nova Iguaçu eu pirei. Lisinho, sem crowd, perfeito e quebrando para os dois lados - algo que no surf era raríssimo de acontecer. Essa pista mudou a minha vida.
Mudei o foco da Surfcraft, que era a minha marca de laminação de pranchas de surf, para o Skate.
Passei a ser skatista e não um surfista que andava de skate.
Tratei de tocar a coisa pra frente, criei uma equipe e organizei o 1º campeonato de skate em pista do Brasil.
Quando começou sua história na mídia especializada?
Foi através desse 1º campeonato de skate em pista do Brasil que entrei no mundo editorial do skate. Depois do evento recebi um telefonema do Alberto Pecegueiro, então editor da revista Brasil Surf, me perguntando sobre o texto do campeonato para a revista. Eu disse que ele nunca havia me pedido tal texto… ele riu e mandou “Ah não? Então escreve e me manda para a gente publicar na revista”!
Assim comecei a publicar uma coluna sobre skate na Brasil Surf, e em 1978, a editora lançou a Brasil Skate, de onde eu era Editor Adjunto, escrevendo, pautando e ajudando na diagramação da revista.
Quanto tempo durou a revista Brasil Skate?
Infelizmente a revista só teve 3 edições, que hoje são clássicos itens de colecionadores. Em 1980 planejei uma ida para a Califórnia para estudar Inglês no ELS (English Language Center) e antes de partir, me reuni com Nilton Barbosa e Jaques Nery e ajudei a criar o embrião da revista Visual Esportivo e me mandei para os EUA.
E como foi esse seu início na Califórnia?
Cheguei a dividir um apartamento studio com o Tchap Tchura e o Kao Tai, que havia ido para estudar business. Tchap ficou pouco e eu e Kao ficamos e nos tornamos os "Brazilian Skate Bros", frequentando direto o Marina Skatepark, e correndo os eventos da ASPO (Association of Skatepark Owners) e assim acabamos nos engendrando na cena local. Eu, por sorte, consegui um trabalho no Marina Skatepark, e fiquei mais que local do pico, onde fiz várias amizades que duram até hoje.
Lembro bem do Christian Hosoi, molequinho com 12 anos de idade, ensinando a mim e ao Kao a dar invert na Top Keyhole!
Como você entrou no universo das filmagens de skate?
Voltei ao Brasil em 1981, Kao ficou por lá para completar os estudos. Em 1983 estreou na TV brasileira o Realce, o 1º programa realmente jovem a abordar os esportes de ação. Passados 6 meses de programa, fui chamado para substituir o Robertinho como Diretor Musical, pois ele iria prestar Serviço Militar, e como, graças ao skate já manjava bem de música, o convite me foi feito e aceito.
Consegui uma cópia do "Powell Peralta Skateboard Video", de 1982, e exibimos por pedaços no Realce. Esse filme foi de grande importância para mim! Posso dizer que por causa dele enveredei na carreira de Produtor de Vídeo. Nessa época meu irmão tinha um dos 1ºs VHS que tive notícia e mais que rapidamente peguei emprestado para começar a produzir vídeos… digamos assim. Eu comprava e devorava uma revista chamada "Video News", onde aprendia dicas e técnicas de gravação.
Em 1984, o pessoal do Realce, que era exibido aos sábados, conseguiu um horário de meia hora de 2ª a 6ª feira, criaram o Vibração e me colocaram como diretor. Assim surgiu a necessidade cada vez maior de produzir skate para TV e...
...encarei a missão que passou a fazer parte da minha vida: documentar skate e exibi-lo na TV, TV aberta, diga-se de passagem.
Bem, esse é um resumo do caminho que trilhei até virar oficialmente produtor de vídeos de skate.
Qual equipamento que costumava usar e como fazia suas edições?
O meu 1º equipamento nem meu era, era um VHS Recorder Panasonic com Câmera acoplada através de um cabo de 12 pinos. Depois surgiram as VHS camcorders. Em seguida foi lançado as 8mm, Hi8 e em 1997 tive a minha 1ª câmera digital, uma Sony VX1000.
As edições no início eram caóticas, era necessário copiar de um VHS para U-Matic (formato de fita de vídeo analógico), para poder editar os clips na emissora, isso em apenas algumas horas.
Pela cronologia de edição passei pelos U-Matic, Beta Cam até chegar ao mundo digital, através de fitas no início, só começando a usar cartões já no século 21.
Tinha uma equipe de trabalho ou era tudo você que fazia?
98% produzi sozinho. Quando a coisa aumentou de tamanho, chegando no SporTV, começaram a rolar viagens anuais para gerar conteúdo, além da cobertura dos Campeonatos Brasileiros e Mundiais, onde eu contava com um câmera man ajudando a colher as imagens.
Como foi o processo para você se envolver e poder participar das sessões e campeonatos com grandes estrelas do skate como Christian Hosoi, Dave Duncan, e muitos outros?
Antes de ser homem de TV sempre fui skatista. Passei a ser um skatista com uma câmera na mão, documentando as minhas andanças pelo mundo do skate. Fiquei algumas vezes na casa do Duncan, bem no início dos anos 80, com acesso aos Alva Boys e todo aquele universo.
Nos anos 90, comecei a ficar na casa do Chicken, gravando sessions memoráveis na sua piscina e em outras em Huntington Beach. Fiz uma boa amizade com o Salba, um Pool Master, que me ajudou a gerar muito material de skate em piscinas.
Lancei 5 videos de skate, sendo que um deles, o Skateboard de 1994, foi distribuído pela Warner Vídeos - não vendeu quase nada. Na era dos Videoclubes, era difícil concorrer com o catálogo de VHS deles, com nomes como Madonna, Fleetwood Mac, Prince, The Smiths…
Como foi capturar essas imagens da era analógica até a digital?
Uma verdadeira aventura! Comparo muito ao andar de skate, onde você aprende a andar, andando. Fui aprendendo a gravar e editar, fazendo.
Como você vê hoje toda essa evolução tecnológica, que para produzir um vídeo basta ter um celular. Quais os prós e contras?
A grande vantagem é a facilidade de acesso a meios de produzir seus próprios vídeos. Hoje em dia os celulares gravam em 4K!
Mas qualidade não é um fator decisivo para se fazer bons vídeos, apenas ajuda. Vai depender muito da criatividade de cada um, e nessa, a popularização da plataforma faz uma grande diferença.
Pode-se experimentar à vontade, sem ter de gastar nada ou quase nada.
Hoje, com os cartões digitais, você tem um número quase infinito de tentativas para realizar uma boa foto ou vídeo. E você ainda pode ver o resultado na hora!
Assim sendo, é lógico que o número de pessoas interessadas em trabalhar com vídeo venha crescendo exponencialmente!
Todos tem fácil acesso a um canvas limpo, uma tela pronta para criar a sua arte.
Como toda arte, tem alguns que se destacam do óbvio.
Quando se tem muita gente fazendo a mesma coisa, é preciso achar seu próprio caminho. E é aí que a criatividade se revela.
Não é o equipamento de última geração que vai fazer você se destacar dos demais.
Existem artistas e ARTISTAS, e não é a técnica que faz o diferencial. É o olhar, a percepção única e autêntica de cada um.
Uma mensagem para quem quer seguir seus passos e trabalhar com vídeos de skate:
Seguir meus passos? ;)
Para mim tudo aconteceu de modo espontâneo, nada foi planejado do tipo “vou começar a trabalhar com vídeo, e tal”.
O vídeo se encaixou perfeitamente ao meu lifestyle de skatista.
Poder documentar as minhas andanças e dos meus amigos no mundo do skate era algo fantástico. Transformar isso em sustento, foi bem mais do que o planejado!
Para finalizar, você tem uma dica para dar para aqueles que pretendem trabalhar com vídeos de skate?
Ter paixão pelo que faz. Assim como no skate, se entregar de corpo e alma, o que já é tudo!
O resto é transpiração e inspiração!
Se você gosta do que faz, vai sempre procurar uma forma de continuar fazendo. É causa e efeito!
Citando dois grandes filósofos:
Confúncio: “Escolhe um trabalho de que gostes, e não terás que trabalhar nem um dia na tua vida.”
Aristoteles: "É fazendo que se aprende a fazer aquilo que se deve aprender a fazer."