No recém lançado “Controvérsia”, zine idealizado e realizado pelo skatista e antropólogo Giancarlo Machado, visa falar de temas pouco explorados e até de assuntos tabus para os skatistas.
A edição de estreia do zine, com apenas 50 exemplares impressos, chega com o pé na porta e apresenta a matéria de capa que aborda sobre outro prisma o surgimento do skate, bem diferente da tradicional história de que o skate descende do surf.
“A capa do zine é uma provocação. Optei em colocar um patins nela para chocar aqueles skatistas que gostam de criticar sem conhecer outros fatos em jogo. Muitos daqueles que receberam o zine ficaram espantados com a capa, mas depois, lendo com calma o conteúdo, compreenderam o meu objetivo”, comentou Gian.
Em uma breve pesquisa Gian logo constatou a grande importância, não do surf, mas do patins para o surgimento do skate. Prova disso são os primeiro skates fabricados, isso na década de 50 e 60, que já viam com um par de trucks bem similares aos dos patins da época.
“Até a década de 50 do século passado, aquilo que conhecemos como ‘skate’ não passava de uma brincadeira de crianças. Em tal período, a sua fabricação era até improvisada"
Rodas e eixos de patins eram anexados a uma tábua reta qualquer, sem inclinação alguma.
– trecho do tópico “Roller Derby, o skate pioneiro”, do zine Controvérsia.
Na década de 50 a marca Roller Derby lançou o primeiro skate fabricado e comercializado em série.
Só para traçar um paralelo, as rodas de uretano, responsáveis pela revolução do skate, só foi inventada em 1973. E os conhecidos Z-Boys de Dogtown, só apareceram por volta do ano de 1975, muitos anos após os relatos dos primeiros skates fabricados.
Outra grande prova da grande influência do patins no skate está registrado nas páginas do “Built to Grind” livro que conta a história de uma das marcas mais antigas e 'core' do skate, a Independent Trucks. Logo no começo de sua história, no final dos anos 70, chegou a fabricar uma espécie de truck para patins, mas para alívio de muitos skatistas o produto não chegou a ser vendido.
Claro que não podemos tirar o mérito do surf na influência do poscicionamento em cima do skate, além da semelhança dos primeiros movimentos e manobras realizadas sobre uma prancha com rodinhas, mas com certeza a importante parte mecânica de um truck com rodas herdada do patins foi imprecindível na funcionalidade do skate que conhecemos atualmente.
Aproveitamos para perguntar para Giancarlo Machado como surgiu a ideia da polêmica matéria: “Os primórdios do skate despertam a minha curiosidade. Eventualmente busco referências que possibilitam novas pistas importantes para a compreensão de sua história. O discurso comumente propagado sobre o surgimento do skate sempre enaltece a importância do surf. É aquela máxima de que "os surfistas inventaram o skate". No entanto, para além disso, é preciso compreender outros processos em curso, como a propagação do patins no começo do século passado. Os primeiros skates da história foram fabricados a partir de peças de patins. A Roller Derby é um bom exemplo de marca que fabricou, ainda na década de 1950, produtos para ambas as práticas. A influência do surf veio somente a partir dos anos 60, sobretudo por meio das manobras. É preciso deslocar a sua importância exacerbada, e também atribuir protagonismo a outras práticas que têm sido esquecidas, como os patins e, porque não, o patinete."
A ideia da matéria foi justamente problematizar a história do skate, colocar em xeque o velho discurso que enaltece apenas o surf.
Quem se interessar pelo zine Controvérsia, e quiser tentar conseguir uma das cópias restantes da limitada edição #00 basta entrar em contato pelo e-mail: controversiazine@gmail.com
E sobre a próxima edição Gian adianta: “Já tenho muitas ideias para a próxima edição, estão anotadas, preciso apenas produzir os textos. Quanto a capa, certamente haverá mais uma polêmica. Gosto de coisas bizarras, e entre provocações, curiosidades, resgate da história e poesias, pretendo fazer uma pequena matéria sobre um skate, mas não o que utilizamos, mas o que habita nas profundezas do oceano pacífico. Parece non sense, mas todos os tipos de skates, inclusive os com vida, tem espaço no "Controvérsia". Deixo o mistério dessa matéria no ar...”
Vale ressaltar que Gian é um grande estudioso do skate. Em 2014, Giancarlo Machado, lançou seu primeiro livro: " De carrinho pela cidade: a prática do skate em São Paulo". Além de skatista e mineiro Gian é Bacharel em Ciências Sociais, e Mestre em Antropologia Social.
Para adquirir o livro acesse o site da Editora Intermeios.